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Sofia Amorim

Necessidade de respostas

Em casa, quando pequena, ao perguntar o significado de uma palavra, escutava todas as vezes: “vai procurar no dicionário”. Eu era curiosa e, por mais que também fosse preguiçosa, costumava ir até o livro enorme para tirar a minha dúvida. Eu sempre fui alguém cheia de perguntas, a tal ponto que questionava meu próprio nome ~ como uma pessoa que tem tantas dúvidas pode se chamar Sofia? Eu tinha ~ acho que ainda tenho ~ uma necessidade de saber tudo sobre tudo e uma ansiedade em querer saber logo.


Eu te pergunto: quanto tempo você demora, quando surge uma dúvida, para ir até o Google e descobrir a resposta?


Essa necessidade de respostas, talvez, não seja atual. Ao mesmo tempo, sinto que o imediatismo, essa necessidade de uma resposta urgente, pode ser que seja bem contemporânea. Por que esperar quando temos acesso a todo tipo de informação?


Vejo dois movimentos dentro dessa necessidade: o primeiro, relacionado à quantidade ~ saber muito; o segundo, relacionado ao tempo ~ não conseguir lidar com o tempo, não dar tempo para a questão se desenvolver em nós.



[Uma observação, para escrever esse texto, fiquei com vontade de trazer outros autores. Sim, esse diálogo é sempre bom, até para não ficarmos inventando a roda. Só que, ao mesmo tempo, qual a importância de, em um texto informal, eu precisar comprovar minhas ideias? Parece que não é necessário somente saber tudo ~ é preciso saber quem, como, quando e de que modo disse também.]


Olha só o movimento do contemporâneo. É lindo e absurdamente opressor, ao mesmo tempo. Eu me lembro [tô nostálgica, hoje] de quando a gente imaginava os andares subterrâneos do Vaticano, escondendo livros, um conhecimento que eu jamais teria acesso ~ gosto de imaginar que essa biblioteca existe e que, um dia, por algum milagre, eu poderei visitá-lo. Hoje, não precisamos ir a bibliotecas distantes para descobrir a maior parte das coisas que já foi escrita e pensada pela humanidade ~ basta acesso a dispositivo com internet, um pouco de paciência e os termos certos para a busca.


Essa possibilidade de acesso de todos a todo tipo de informação é bem linda mesmo. Mas... não é porque a internet possibilita isso que somos obrigadas a saber de tudo ~ e parece que somos, não parece? Esse pensamento carrega uma contradição absurda: é impossível saber de tudo, mesmo que se saiba muito. Ainda assim, vira e mexe, todo santo dia, é só ler os comentários de qualquer postagem nas redes sociais para nos depararmos com as cobranças sobre a pessoa não saber sobre algo, tirando qualquer possibilidade de recorte de lugar, de cultura, de formação etc.


O outro ponto [mais importante, na verdade, porque o anterior é bem óbvio, ou não] relaciona-se com isso de “conviver com a dúvida”. O que isso significa? Significa que não iremos responder de imediato à questão surgida. Vamos dizer que a convidaremos para passar uma temporada em nossa casa, tipo visita mesmo. E, podemos combinar, ficar com uma questão nos apertando é algo bem próximo disso.


É como quando você chama sua avó [falei que eu estou nostálgica hoje] para passar uns dias

em casa: você acorda e ela já está na cozinha te esperando. Depois do café, pede licença pra vó para poder trabalhar um pouco. Até esquece dela. Dali algum tempo, ela bate na porta perguntando se você precisa de algo. Desde a manhã até de noite, a vó tá ali: te cuidando, te lembrando da existência dela, te chamando de vez em quando. Se bobear, assim como a dúvida, a vó vai até na cama te dar boa noite, fia.


Quando a gente decide conviver com nossas inquietações, parece acontecer algo semelhante: elas ficam na espreita, nos rondando, procurando um modo de aparecer, quando não chegam a tomar a cena toda. A gente carrega a pergunta aonde for ~ como a vó, que em tempos não pandêmicos queria ir conosco dar uma volta ~ e a gente encontra com as questões nos lugares mais inusitados ~ seja lendo um texto não relacionado ou a vó arrumando sua gaveta de calcinhas.


Então, tenho me perguntado [a partir da convivência com amigos que sabem chamar a vó pra passar uns dias em casa, ou seja, convivem com as questões], por que precisamos de respostas rápidas? Por que não podemos passar dias com aquilo nos incomodando, nos tirando da zona de conforto?


Qual efeito dessa convivência? O que isso nos traz? Eu nem queria trazer respostas, acho que você mesma poderia procurá-las, mas suspeito de uma aproximação: a possibilidade de encontrar outras respostas. Também cheguei a pensar no erro e acerto: ao invés de erro, pensar em níveis de respostas, cada vez diferentes umas das outras, completando-se, até encontrar com uma mais apropriada à pergunta.


Aqui, sim, eu tô falando de texto ~ não sei o que escrever, queria escrever agora, e etc. ~ mas essa inquietação é bem ampla, não é? Parece estar relacionada a um modo de estar na vida. Tenho a impressão de que esse modo pode ser um certo combate ao imediatismo contemporâneo. Outra impressão é a do devaneio ~ uma vontade daquele tempo com o rosto colado à janela do ônibus, em que o tempo parece criar um hiato e podemos carregar, durante algumas horas, sonhos de como será a viagem, de quem será aquela casinha, de como será a volta. Naqueles momentos, não eram as respostas que curtíamos, era a própria viagem e todas as questões não respondidas, borboletando o estômago.

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